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Mobilização para renovar águas

Foto: Lucas Colombo/Clicatribuna

Foto: Lucas Colombo/Clicatribuna

Era junho de 1974. Os botos, que pela primeira vez invadiram a Barra do Torneiro, em Jaguaruna, anunciavam a grande pescaria que viria pela frente. "Não sei se foi pela enchente que tinha devastado a região, mas, naquele mês, tivemos uma grata surpresa. Lembro como se fosse hoje. Estávamos sem nossos barcos, que foram levados pelas águas, mas isso não foi empecilho para presenciarmos o que seria uma das últimas grandes pescas que o Rio Urussanga (Barra do Torneiro) nos daria. Ficamos a noite toda tarrafeando. Amanhecemos com 420 tainhas em um caiaque improvisado e uma recordação para a vida toda", conta o pescador Rene Feliciano Cardoso. Foi a partir daquele dia que a comunidade percebeu que a natureza não poderia lutar contra a poluição que cada vez mais chegava às águas límpidas da barra. O rio, que por tantas vezes serviu para alimentar os pescadores da região e suas famílias, aos poucos foi "morrendo" e, com ele, a garantia de alimento em abundância. 

Março de 2014, após quase 40 anos, a história se repete, mas com outro desdobramento. Desta vez com Paulo Guimarães. Morador de Guarapuava, no Paraná, não conhecia toda a transformação por que a Barra do Torneiro passou durante essas quatro décadas. Com o anzol em punho e camarão como isca, tentou por horas pescar naquelas águas, em vão. "Achei que conseguiria pescar algo aqui, mas não. É uma pena que um local assim esteja praticamente sem vida", lamenta. O sinal de positivo feito por Rene com a cabeça confirma o sentimento do paranaense. "Dói muito saber que foi o homem que destruiu tudo isso", comenta Rene. 

Rene herdou do pai a profissão de pescador. A família criada à beira do mar sempre trouxe da pesca o sustento. "Aqui existia água boa para tomar e peixe para comer. Não precisava de mais nada. Lembro que meu pai dizia para a mãe colocar a chaleira esquentar enquanto ele ia pegar o peixe. Em pouco tempo, voltava com comida para os oito filhos. Na barra, era comum a gente ver passar a miragaia, um peixe que pesava até 40 quilos. Às vezes, pegávamos de seis a oito em uma única vez. Era uma festa! Pena que tudo isso fica só na lembrança", relembra. 

Conforme o site Clicatribuna, a escassez de peixe na Barra do Torneiro fez o pescador buscar o sustento da mulher e dos três filhos em outro lugar. "Tivemos que ir buscar o peixe que tinha aqui em alto-mar. Infelizmente a poluição acabou com essa riqueza que tínhamos aqui. Hoje meus filhos já não vão seguir a minha profissão, vai chegar a hora em que não só os peixes vão morrer, mas o pescador vai também deixar de existir", lamenta. 

Comitê da Bacia do Rio Urussanga luta para melhorar qualidade da água 

No Dia Mundial da Água, o alerta para a preservação dos recursos hídricos vem sendo realizado pelo Comitê da Bacia do Rio Urussanga. "Estamos trabalhando para que não ocorra com outros locais o que aconteceu com o Rio Urussanga. O assoreamento se deu principalmente pelos resíduos colocados desde a nascente no Rio Carvão até o desemboque na Praia do Torneiro. Seja de carvão, lixo ou esgoto sanitário, tudo contribuiu para chegarmos à situação que estamos vivendo hoje. A partir de agora, é trabalhar para rever-ter isso e focar na proteção das áreas que ainda não estão degradadas", explica a consultora técnica do Programa Santa Catarina Rural, que apoia o Comitê da Bacia do Rio Urussanga, Cenilda Maria Mazzucco. 

Segundo Cenilda, um projeto de desassoreamento do Rio Urussanga já está na Fatma aguardando liberação de recursos. "É um trabalho complexo. Por isso estamos formando uma comissão para acompanhar todo esse processo, que contará com representantes de todos os municípios por onde o rio passa. Podemos dizer que já estamos sentindo alguma melhora, mas porque as pessoas também estão mudando. Temos a certeza de que, para melhorar a qualidade da água, ainda precisa de muito trabalho, mas vamos continuar com o foco na preservação e na educação para garantir que a água seja preservada", reforça Cenilda.