Segurança

Flagrante: elas estão por trás da interrupção de vidas

Reportagem do A Tribuna constatou que a idosa, hoje com 78 anos, segue com a prática do crime

Quase três anos após ter sido presa pela prática de aborto, aos 75 anos, uma idosa de Criciúma conti-nua a realizar, mediante pagamento, a interrupção de gestações. Na tarde de 24 de setembro de 2010, a idosa foi flagrada em uma operação da Polícia Civil que culminou em sua prisão em flagrante e na apreensão de materiais que comprovaram a prática criminosa. Na época, as investigações apontaram que ela havia realizado mais de 100 procedimentos ilegais.

A equipe de reportagem do jornal A Tribuna, após investigações, constatou que a idosa, hoje com 78 anos, segue com a prática do crime. Munidas de um gravador, duas repórteres foram até a residência da idosa procurando pelo "serviço". Uma delas se passou por gestante (com poucas semanas de gestação) e pediu ajuda à idosa. Ela atendeu a solicitação.

Na casa estava a idosa e a nora dela. Ambas ficaram desconfiadas quando a reportagem revelou o motivo da procura antes de adentrar o portão. "Isso é caso de polícia. Isso não pode. Vocês duas podem ser presas", alertaram elas antes de abrirem a casa para as repórteres. Elas contaram que os vizinhos não sabem da prática. "Quando vocês chegaram, minha pressão estava nove por oito, até subiu", disse a nora.

Procedimento custa R$ 300

No início da conversa, a duas mu-lheres adiantaram que no local não era realizado o procedimento há algum tempo. No entanto, indicaram outra mulher de Criciúma que faria o procedimento (esta, por sua vez, foi procurada por outros repórteres). "Vocês não podem ir lá antes de eu falar com ela. Ela não atende! Se vocês pagarem a passagem, minha nora leva vocês até a casa dela", observou a idosa.

Ao ser questionada pela idosa sobre o tempo de gestação, a repórter que se dizia grávida disse estar de seis se-manas. "Mas, com este tempo (de gestação), dá até com injeção. E, por sinal, a injeção eu tenho em casa e, se não vier (a menstruação), vocês voltam aqui", sugeriu a idosa. Para aplicar o remédio que provoca o aborto, a idosa deu o preço de R$ 300. "Se demorar muito tempo para fazer a injeção, ela pode não ter o efeito desejado", observa.

“Não há problema em receber a injeção”, diz idosa

A jornalista, mostrando-se insegura com a injeção que receberia mais tarde, foi acalmada pela idosa, que chegou a lhe dar um abraço e disse: "não há problema nenhum em receber a injeção porque o embrião ainda não está formado, é apenas uma bolinha de sangue".

A repórter que se passava por grávida alegou que não tinha dinheiro em mãos para pagar a dose da injeção abortiva e que precisaria ir até o banco retirar o valor (R$ 300). A idosa enfatizou que não realiza mais o procedimento, mas que iria fazer por “pena” da fictícia gestante. Porém, quando as jornalistas se levantaram para ir "buscar o dinheiro", a idosa indagou: "Mas você não quer fazer agora? Minha filha está na cidade e não sabe disso. Quando ela chegar, não vai dar mais", disse.

“Ela é melhor do que um médico”, afirma a comparsa

A idosa afirmou para as jornalistas que tem expe-riência de mais de 50 anos em procedimentos abortivos. "Nunca aconteceu nada com ninguém, já fiz até parto normal", assegura. A nora complementou: "Ela é melhor que qualquer médico". A reportagem deixou a casa da idosa por volta das 14h30min para ir "ao banco pegar o dinheiro".

Duas horas mais tarde, a jornalista que se dizia grávida, acompanhada da "amiga", voltou a casa com os R$ 300 solicitados em mãos. No entanto a injeção não poderia ser aplicada naquele momento porque havia um homem prestando serviços técnicos na residência. "Voltem às 18h. Ninguém pode ver nem desconfiar", falaram em voz baixa a nora e a idosa. Para evitar desconfiança por parte do técnico, a nora disfarçou: "Vocês são amigas da minha sobri-nha, né?!".“

Gestante” é tranquilizada

No horário estipulado, as jornalistas retornam a casa pela terceira vez. A dupla que investigava o caso fez algumas perguntas sobre os riscos do procedimento (a injeção). A idosa adiantou que, após a aplicação da injeção, a "gestante" teria de ficar por aproximadamente dez minutos na casa e que nada iria lhe acontecer. "Em três a quatro dias, a menstruação deve descer. A única coisa que ela pode sentir (a falsa gestante) é uma colicazinha de menstruação. Tem que fazer com fé que vai vir", garantiu a idosa.

Em meio a tantas perguntas das jornalistas, a idosa aparentou desconfiança. "Mas vocês não estão armando uma emboscada para mim. Sejam sinceras. Se eu fizer é porque eu “tô” com pena dela", disse a idosa. A reportagem voltou a questionar o risco à saúde que o procedimento poderia trazer. "Não vai acontecer nada. Isso é para descer a menstruação, o embrião não ‘tá’ formado. Outras meninas que vêm aqui chegam felizes e saem felizes", enfatizou a idosa.

Desistência na hora “H”

Após a explicação, elas acertaram o valor e o pagamento foi rea-lizado. Depois as três deixam a cozinha e seguiram em direção a um quarto. A idosa seguiu para outro cômodo para pegar o medicamento. Poucos minutos depois, a mulher voltou com o medicamento em uma seringa, colocada em uma bandeja de cor prata. A idosa mandou a repórter baixar as calças e deitar de bruços na cama. A injeção estava pronta para ser aplicada. Ela não usava luvas.

Quando chegou a hora de aplicar o medicamento, a repórter anunciou a desistência. "Não quer fazer mais? Agora eu já puxei a injeção. Tenho que colocar fora. Então fica com R$ 150 e eu com os outros R$ 150 para não perder tudo", sugeriu a idosa. "Escuta. Eu sou uma pessoa bem ladina. Vocês não vieram aqui porque alguém mandou? Eu sou bem brava. Vocês não ‘tão’ fazendo sujeira com a gente", indagou a nora às jornalistas.